A primeira impressão que se tem diante do castelo de Valençay é de deslumbramento. Um conjunto de torres que se elevam garbosas para o ar, e de alas intermediárias vastas, extensas, indicando senhorio, poder, grandeza e esplendor.
Nos dois ângulos do corpo principal, erguem-se duas torres muito maciças, fortes e robustas, que formam agradável harmonia com a graça e a elegância da ala central. Esta se compõe de três andares. O primeiro, arejado por grandes portas e janelas em arco, era destinado aos melhores aposentos da casa no tempo em que Valençay foi construído.
No segundo pavimento, onde se abrem vidraças retangulares, outra série de quartos e salas. E, por fim, para quebrar a monotonia que uma fachada desse gênero pudesse apresentar, existe o sótão, bem alto e vasto, como vasta é a própria fachada.
Nele encontramos uma aprazível seqüência de janelas e óculos, embutidos num extenso telhado de ardósia.
A preocupação de ornar está presente em todo o castelo, porém tão circunspecta que o observador a sente sem perceber, e é necessário um pequeno esforço de atenção para distinguir os adornos.
Em grande parte, porque o ornato não se encontra naquilo que se põe para enfeitar, mas na discreta, fina e bela proporção das coisas (arte esta que vem a ser um dos traços característicos do gênio francês). Assim, nesse corpo central, a nota de adereço pode ser vista na espécie de sobrancelha grossa, mas bonita, aposta acima de cada mansarda e de cada óculo do sótão.
Por outro lado, a “cara” séria e o caráter um tanto pesado das torres laterais são aliviados pela existência dos pequenos torreões, vazados e leves, que sobre elas se erguem à maneira de campanários. Na parte central da fachada eleva-se outra torre, de estilo diferente, quadrada, com alto teto em “V”.
Sem ser inteiramente gótica, ela entretanto encerra uma reminiscência de Idade Média que lhe confere particular atrativo. É uma torre de fortaleza. Nos quatro ângulos, pequenos torreões arrendondados, outrora ligados por ameias de que ainda se notam vestígios na base da parede sobre a qual se levantam o teto e as chaminés.
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No muito belo jardim de Valençay, extensos canteiros com grama e arbustos estabelecem certa distinção reverencial entre o visitante e o castelo, em relação ao qual aquele se sente mantido à distância. É compreensível, pois tudo quanto é respeitável, ao mesmo tempo que atrai, impõe certos limites. É o próprio da respeitabilidade, cujo modelo infinito e perfeito é Nosso Senhor Jesus Cristo.
Contemplando as imagens que procuram retratar mais fielmente o Divino Redentor, por vezes nos perguntamos qual seria nossa atitude se Ele, em corpo e alma, estivesse diante de nós. Com certeza, nosso coração teria a tendência de voar até o d’Ele, mas dobraríamos imediatamente os joelhos em terra. É a confirmação de que tudo quanto é respeitável e elevado atrai, mas mantém a posição.
Assim também é Valençay: belo e atraente, porém incute respeito.
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Fascínio e beleza de uma habitação que, à primeira vista, espanta pelo que tem de amplo e na qual, em épocas remotas, tudo girava em torno de uma pessoa: o senhor de Valençay. E de uma família: a dele. Mais ou menos até a Revolução Francesa, o castelo foi, portanto, a residência de uma pequena dinastia feudal, com uma corte local, constituída de nobres das redondezas. Ali se reuniam para festas, caçadas, conversas, ou, no caso dos vassalos, para prestar homenagens ao senhor de Valençay e render-lhe seus tributos.
Igualmente se apresentavam no castelo plebeus, que vinham pedir justiça ou proteção, ou prestar serviços, ou ainda à procura de auxílios materiais, etc. Em suma, o castelo era o centro da vida de toda uma região.
Para tanto contribuía o fato de que Valençay — à semelhança de todos os grandes castelos — situava- se a uma considerável distância da capital do país. De maneira que não só os nobres e aldeões tinham dificuldade em se deslocar até a sede da realeza, como as ordens do soberano encontravam obstáculos para chegar até eles. Assim, o senhor de Valençay vivia em seu feudo como um monarca de diminutas proporções. Um pequeno e esplêndido rei dominando um pequeno e esplêndido reino, onde ele conhecia cada súdito e o chamava pelo próprio nome. Quando partia para uma caçada, ia passear pelo campo ou admitia alguém em seu castelo a fim de tratar dos negócios do governo local, indagava da saúde deste e daquele, indicava remédios, e, não raras vezes, fornecia alimentos e agasalhos.
Procurando atender às mais diversas necessidades de seus súditos, dava conselho sobre o melhor casamento para a filha de Fulano, ou a respeito de em qual batalhão do rei deveria se alistar o filho de Sicrano. Ou ainda escrevia cartas de recomendação para tal moço ou tal moça que manifestasse o desejo de abraçar a vida religiosa. Nestes casos fazia valer sua amizade para com importantes personalidades eclesiásticas, abrindo para seus protegidos as portas de um seminário ou de algum convento.
Numa palavra, o senhor de Valençay era o pai de todos os habitantes do seu feudo, e sua esposa, a mãe. Era um regime patriarcal, em que ambos constituíam o centro e a cúpula do pequeno universo constituído em torno do castelo. E todo o esplendor deste se aliava de modo extraordinário à patriarcalidade que permeava as relações entre as várias classes sociais.
Tudo decorria harmoniosamente dos senhores de Valençay, que estavam para o resto do feudo mais ou menos como, na torre central do castelo, telhados e ameias parecem defluir das duas chaminés postas no alto. Assim como seus antigos senhores, Valençay é grandioso, mas acolhedor. Não infunde medo. Apenas desperta fascínio e respeito.
Plinio Corrêa de Oliveira
Revista Dr Plinio 15 (Junho de 1999)