Protetor da Santa Igreja

Dentre as várias invocações a São José, exceção feita das que o mencionam diretamente ligado a Nosso Senhor Jesus Cristo, nenhuma é mais bonita do que a de Protetor da Santa Igreja Católica.
De algum modo, o protetor simboliza aquilo que protege. Por isso, para a guarda de uma rainha, por exemplo, escolhem-se os mais capazes, que demonstraram maior coragem nas guerras, dando assim provas de maior dedicação à coroa.
Por certo, o Anjo da Guarda da Igreja Católica é o maior da Corte Celeste, pois nenhuma criatura individualmente considerada tem a dignidade da Igreja, Corpo Místico de Cristo, que envolve todos os Santos e é a fonte da santidade deles.
Assim, São José deve ser alguém tão alto, tão excelso a ponto de, por assim dizer, constituir o reflexo da Igreja que ele guarda e estar proporcionado a ela.
Podemos então ter uma ideia da sublimidade do chamado de São José, considerando-o enquanto coidêntico com o espírito da Igreja Católica, exemplar prototípico e magnífico da mentalidade e das doutrinas dela. Vocação tão elevada que só se pode medir por este outro critério: o fato de ser Esposo de Nossa Senhora e Pai adotivo do Menino Jesus e, portanto, proporcionado a Eles.

(Extraído de conferência de 19/3/1969)

São José – Modelo de castidade e de força

Para se formar uma ligeira ideia de quem foi São José, dever-se-ia tomar a Divina Face do Santo Sudário de Turim e deduzir, à maneira de suposição, a fisionomia moral do homem escolhido para ser o pai adotivo de Quem tem aquele rosto sagrado, do homem que foi o esposo da Mãe d’Ele, Aquela que era a sede da Sabedoria e o espelho da  Justiça.

Pai do Leão de Judá e consorte de Nossa Senhora, São José teria de ser um modelo de fisionomia sapiencial, modelo de castidade e de força. Um varão de santidade  inimaginável, a quem coube a sublime missão de governar o Filho de Deus e a Santíssima Virgem.

Plinio Corrêa de Oliveira

São José

Depois de Maria Santíssima, São José foi o mais elevado expoente de virtudes da humanidade. Brilha nele a chama da caridade. Um intenso amor de Deus, uma  espiritualidade e uma vida interior admiráveis fazem de sua alma objeto da complacência da Santíssima Trindade.

Este homem humilde foi chamado a participar de acontecimentos dos quais decorreram os mais notáveis fatos da história do mundo. Pela sua admirável correspondência à graça, São José colaborou de modo eminente no plano divino da Redenção e, desse modo, é merecedor de grande parcela da glória que, legitimamente, cabe ao Divino  Salvador, pela imensidade de benefícios com que nos cumulou.

Plinio Corrêa de Oliveira

São José, esposo de Maria e pai adotivo de Jesus

Eleita pela Santíssima Trindade para ser a Mãe Admirável do Verbo Encarnado, Nossa Senhora é a mais perfeita de todas as meras criaturas. Mesmo se considerássemos,  num só  conjunto, as excelências dos Anjos, dos Santos e dos homens que existiram, existem e existirão até o fim do mundo, não teríamos sequer uma pálida ideia das  celestes perfeições de Maria, que reluziram aos olhos de Deus desde o primeiro instante de sua Imaculada Conceição.

Para cumprir os eternos desígnios da Divina Providência no tocante à Redenção da humanidade, foi preciso que, em determinado momento, essa criatura excelsa contraísse legítimo matrimônio. Assim poderia Ela, sem detrimento de sua reputação, conceber miraculosamente e dar à luz o Filho do Altíssimo.

O único homem à altura de Jesus e Maria

Ora, entre esposo e esposa deve haver certa proporcionalidade: não pode um ser por demais superior ao outro. Era necessário, portanto, surgir um homem que, por seu amor a Deus, por sua justiça, pureza, sabedoria, enfim, por todas as  suas qualidades, estivesse à altura daquela augusta Esposa. Mais ainda. É também conveniente que o pai seja proporcionado ao filho. Por isso, era preciso que esse mesmo  varão, com toda a dignidade, arcasse com a honra de ser o pai adotivo do Verbo feito carne.

E houve um único homem criado para essa sublime missão, um homem cuja alma recebeu do Pai Eterno todos os adornos e predicados que o colocassem inteiramente à  altura de seu chamado. Esse homem, entre todos escolhido por estar na proporção de Nossa Senhora e de Nosso Senhor Jesus Cristo, foi São José.

A ele coube essa glória, esse píncaro inimaginável de ser esposo da Virgem-Mãe e pai legal do Menino Jesus. Como legítimo consorte de Nossa Senhora, possuía São José  plenos direitos sobre o Fruto das imaculadas entranhas d’Ela, embora este Fruto houvesse sido engendrado pelo Espírito Santo. Quer dizer, sem contar a própria maternidade divina, não se pode conceber vocação mais extraordinária! É uma grandeza inconcebível.

Pensemos, por exemplo, nos momentos em que São José trouxe em seus braços o Menino Jesus, ou naqueles em que ele O viu praticar os atos da vida comum na santa casa  de Nazaré, ou ainda nas horas em que O contemplou imerso nos colóquios com o Padre Eterno…

Consideremos quão puros deviam ser seus lábios, e quão insondável a sua humildade para conversar com o Divino Infante, responder às perguntas d’Ele ou Lhe dar um  conselho, quando solicitado. Um simples ser humano, formado e plasmado pelas mãos do Criador, ensinando a Deus!

Pensemos, ainda, no trato repassado de elevação e respeito entre São José e Nossa Senhora, quando Ela se ajoelhava diante dele para o servir. Ele vê aquela Criatura, que é o  Céu dos Céus, inclinada à sua frente, e aceita seus préstimos. Como se tal não bastasse, a Esposa também se aconselha com ele, troca opiniões e acata suas ordens.

Numa palavra, ele era o homem que tinha bastante sabedoria e pureza para governar a Deus e a Virgem Maria. Então se compreende quão inimaginável é a grandeza de São José!

Excelências de príncipe e operário

Para se traçar o verdadeiro perfil moral do chefe da Sagrada Família, seria preciso saber interpretar a Divina Face do Santo Sudário de  Turim e, à maneira de suposição, deduzir algo da personalidade de quem foi o educador daquele semblante que ali está, e o esposo da Mãe d’Ele.

Casado com Aquela que é chamada de o “Espelho da Justiça”, pai adotivo do “Leão de Judá”, São José devia ser um modelo de fisionomia sapiencial, de castidade e de força.

Um homem firme, cheio de inteligência e critério, capaz de tomar conta do Segredo de Deus. Uma alma de fogo, ardente, contemplativa, mas também impregnada de carinho.

Descendia da mais augusta dinastia que já houve no mundo, isto é, a de David. Segundo São Pedro Julião Eymard, Fundador da Congregação dos Padres Sacramentinos, os  judeus reconheciam em São José o homem com direito ao trono real, caso a monarquia legítima fosse restaurada na Terra Santa. Direito este que Nosso Senhor Jesus Cristo herdou de seu pai legal, e por isso foi aclamado como “o filho de David”, quando entrou em Jerusalém. Ou seja, não era um descendente qualquer do Rei Profeta, mas o  primogênito pretendente ao trono. E São José era o varão por meio de quem esta dignidade se transferiu para o próprio Filho de Deus.

Quis a Providência nobilitar a classe operária, fazendo com que o pai adotivo de Jesus fosse também trabalhador manual, exercendo o ofício de carpinteiro. Desse modo, São  José reunia em si os dois extremos da escala social na harmonia interior da santidade e da pessoa dele. Estava no ápice como príncipe da Casa de David, mas era um príncipe empobrecido, que tirava do seu labor artesanal o sustento da Sagrada Família.

Como operário, soube ser humilde e tributar o devido respeito aos que lhe eram superiores. Como príncipe, conhecia também a missão de que estava imbuído, e a cumpriu  de forma magnífica, contribuindo para a preservação, defesa e glorificação terrena de Nosso Senhor Jesus Cristo. Em suas mãos confiara o Padre Eterno esse Tesouro, o  maior que jamais houve e haverá na História do universo! E tais mãos só podiam ser as de um autêntico chefe e dirigente, um homem de grande prudência e de profundo  discernimento, bem como de elevado afeto, para cercar da meiguice adorativa e veneradora necessária o Filho de Deus humanado. Ao mesmo tempo, um homem pronto  para enfrentar, com perspicácia e firmeza, qualquer dificuldade que se lhe apresentasse: fossem as de índole espiritual e interior, fossem as originadas pelas perseguições dos adversários de Nosso Senhor.

O herói da confiança

Consideremos, por exemplo, a tremenda provação que sobre ele se abateu, logo no início de seu matrimônio com Maria Santíssima. No Antigo  Testamento, a maior ventura que podia almejar um judeu era a de ser contado entre os ancestrais do Messias. Em vista disso, a imensa maioria do povo eleito procurava contrair matrimônio e ter filhos, não sendo raro considerar-se a esterilidade como um sinal de desprezo e opróbrio.

Mas, São José, movido pela graça, não quisera se casar, a fim de conservar a virgindade. Levava ele sua tranquila vida de homem casto e puro, quando, inesperadamente,  recebe uma convocação: todos os descendentes diretos de David deviam comparecer diante de uma Virgem chamada Maria, a fim de se poder escolher um marido para Ela.

Obediente, São José se apresenta ao lado de seus parentes, confiando na voz da graça que o fizera abraçar a virgindade. No seu íntimo, alimentava a certeza de que o  escolhido seria outro.

Como naquele tempo se viajava com o apoio de um bordão, todos se apresentaram com o seu. O sacerdote encarregado da cerimônia determinou: aquele em cujo bastão desabrochar uma flor, este será o eleito para se unir a Maria.

São José olha para seu cajado… e nele vê aparecer uma flor! Evanesceram de súbito todos os seus anseios de virgindade. Como será agora? Ele confia. É um milagre que o obriga a se casar com Maria. Entretanto, no fundo de sua alma, quer continuar virgem! Sereno e corajoso, aceita a disposição divina.

Entra em confabulação com a jovem e descobre que Ela também fizera voto de virgindade. A dificuldade parecia estar resolvida: ambos se manteriam intactos. Que  felicidade! Seus anelos permaneciam vivos. Com o passar dos dias, ele percebe a incomparável riqueza de alma dessa Virgem que foi posta no seu lar. Pensa: “Protegê-La-ei magnificamente. Aqui estou para defendê- La no esplendor de sua personalidade contra toda espécie de ataques.”

Em determinado momento, porém, o impensável acontece: ele nota que a Virgem está à espera de um Filho. No espírito de São José se estabelece a perplexidade. Ele não  podia entender o que se passava, depois de tantos milagres… O florescimento do bordão, o encanto com que os dois se comunicaram o recíproco desejo da perpétua  virgindade, a alegria de alma que então sentiram: “É claro! Deus nos colocou no mesmo caminho. Ele prometeu e está cumprindo a promessa!”

Mas, agora, o incompreensível… São José passa por uma inenarrável provação, e Nossa Senhora também, uma vez que Ela percebia em toda a medida o sofrimento de seu  esposo. Angústia tanto mais intensa quanto ele sabia ser impossível uma traição da parte d’Aquela Virgem incomparável. Ora, pela lei judaica, se uma esposa prevaricasse, o  marido tinha a obrigação de expulsá-la do seu lar.

Mas São José tinha a certeza de que Maria não havia cometido nenhum pecado. Não querendo tomar uma atitude injusta em relação a essa Virgem tão santa, e não sendo  capaz de encobrir  aquela situação irremediável, São José resolve deixar despercebido a casa de Nazaré. Antes da longa jornada que o esperava, resolveu descansar para  reparar suas forças. Na madrugada seguinte ele partiria, levando simplesmente seu bordão, um pouco de comida e o fardo de uma grande incógnita, mais pesada que o  Monte Everest: Como se passou isto? Meu Deus, meu Deus…eu confio na vossa promessa!

Apesar da aflição, tinha a alma tão confiante e tão serena que adormeceu. E, ao dormir, sonhou. No sonho teve esta recompensa: Deus lhe comunicou que aquela Criança  formada no claustro virginal de Maria era o  Verbo Encarnado, Filho do Divino Espírito Santo.

Quando São José despertou, a paz reinava na sua alma. E Nossa Senhora, ao ver o semblante luminoso de seu esposo, soube que a provação dele havia cessado. Porque foi  um herói da confiança, São José recebeu a maior e mais extraordinária missão que um homem teve na Terra. Ele era o consorte da Virgem Mãe, d’Aquela que daria à luz o  Homem-Deus e Redentor do mundo. Nisto florescia a promessa de virgindade que lhe fora feita. Tudo se cumprira além do inimaginável.

Cavaleiro-modelo na proteção do Rei dos Reis

Entretanto, as dificuldades não haviam abandonado as sendas pelas quais caminharia São José. Basta recordar, por exemplo, as recusas de que foi objeto nas estalagens de  Belém, quando procurava abrigo para Nossa Senhora, na iminência do nascimento do Menino-Deus. Ou então a fuga para o Egito.

“Fuga para o Egito”… Quatro palavras que a nós, homens do século XX, parecem banais: toma-se um avião e em pouco tempo se vai de Jerusalém ao Egito. Não era assim no  empo em que São José, recebendo o aviso de que o cruel Herodes procurava matar o recém-nascido Rei dos judeus, foi obrigado a tomar a Mãe e o Menino e com eles partir para a terra dos faraós.

Uma viagem incerta, longa, através de desertos onde se ocultavam toda sorte de perigos: das feras famintas aos ladrões e salteadores, capazes de não só roubar e matar,  como também de levar os viajantes em cativeiro, a fim de comercializá-los nos mercados de escravos. E São José, com seu coração de fogo, sua previdência e força varonil, enfrentou todos esses obstáculos, levando Nossa Senhora sobre um burriquinho e, ao colo d’Ela, o Menino Jesus, o Deus que quis ser fraco nos braços e nas mãos do glorioso patriarca.

Costuma-se apreciar e louvar, com justiça, a vocação de Godofredo de Bouillon, o vitorioso guerreiro que, na Primeira Cruzada, comandou as tropas católicas na nascido Rei dos judeus, foi obrigado a tomar a Mãe e o Menino e com eles partir para a terra dos faraós.

Uma viagem incerta, longa, através de desertos onde se ocultavam toda sorte de perigos: das feras famintas aos ladrões e salteadores, capazes de não só roubar e matar, como também de levar os viajantes em cativeiro, a fim de comercializá-los nos mercados de escravos. E São José, com seu coração de fogo, sua previdência e força varonil, enfrentou todos esses obstáculos, levando Nossa Senhora sobre um burriquinho e, ao colo d’Ela, o Menino Jesus, o Deus que quis ser fraco nos braços e nas mãos do glorioso Patriarca.

Costuma-se apreciar e louvar, com justiça, a vocação de Godofredo de Bouillon, o vitorioso guerreiro que, na Primeira Cruzada, comandou as tropas católicas na conquista de Jerusalém. É uma linda proeza! Ele é o cruzado por excelência.

Porém, muito mais do que retomar o Santo Sepulcro é defender o próprio Nosso Senhor Jesus Cristo! E disso São José foi gloriosamente encarregado, tornando-se o  cavaleiro-modelo na proteção do Rei dos Reis e Senhor  dos Senhores.

Na coorte dos Santos, o primeiro abaixo de Nossa Senhora

Ao lado de todas as glórias que se acumularam sobre ele, São José recebeu, já nesta Terra, um prêmio inestimável: é o patrono da boa morte. Com efeito, dir-se-ia que ele teve um passamento de causar inveja, pois faleceu entre os braços de Nossa Senhora e os de Nosso Senhor, que o  cercaram de todo o carinho e consolação na sua última hora. Não se pode imaginar morte mais perfeita, com Eles ali, fisicamente presentes. De um lado, Nosso Senhor  cumulava seu pai adotivo de graças cada vez maiores, à medida que a alma de São José continuava a se santificar nos derradeiros transes da agonia. De outro, Nossa Senhora lhe sorria com respeito, e procurava aumentar-lhe a confiança:
— Meu esposo! Lembre-se de que tudo se cumprirá.

Coragem! vamos para a frente!

Em determinado momento, São José exala o último suspiro, e o Limbo se abre para a alma dele. Ali ficaria ele até o instante, entre todos bendito, em que a alma santíssima   de Jesus, que morrera crucificado, desceu ao encontro daqueles eleitos, a fim de colocar um jubiloso termo na sua grande espera. Alguns — Adão e Eva, por exemplo — lá se  achavam desde os primórdios da humanidade, aguardando durante milênios o Redentor que os levaria para a eterna bem-aventurança.

E o Messias veio. Podemos bem imaginar que toda a coorte do Limbo se reuniu em torno de São José para receber o Salvador. E que Este, tão logo ali se mostrou, resplandecente de glória, tendo perdoado e redimido o gênero humano, manifestou-se de modo especial a São José, como que exclamando: “Oh! meu pai!”

Era o ápice do cumprimento de todas as promessas, a perfeita realização de um chamado que passou por indizíveis perplexidades e incomparáveis glórias. E São José,  esposo de Maria Virgem, pai adotivo de Jesus, declarado Patrono da Igreja, ocupa no Céu um lugar tão eminente que recebe o culto de proto dulia. Ou seja, abaixo de Nossa  Senhora — a qual merece a devoção de hiperdulia — é ele o primeiro a ser venerado na extensa hierarquia dos Santos.

Grandiosa recompensa à qual fez jus esse varão que praticou em grau elevadíssimo a virtude da confiança.

 

Plinio Corrêa de Oliveira

São José

Em geral, as pinturas e esculturas que representam a Fuga para o Egito mostram Nossa Senhora montada num burrico, trazendo aos braços, com uma imensidade de carinho, cuidado e respeito, o Menino Jesus. À frente ou ao lado d’Eles, caminha São José.

Sendo o membro mais forte da Sagrada Família, competem-lhe, explicavelmente, os maiores incômodos e cansaços da viagem. Fadiga que o castíssimo esposo de Maria  aceitava com sublime disposição de alma, pois sabia que devia cercar Nossa Senhora de todo o conforto possível: era Ela quem levava o adorável pequeno peso, aquele corpo divino que um dia seria suspenso nos braços implacáveis da Cruz…

Glorioso São José

A primeira das glórias terrenas de São José é a do homem recusado às portas das estalagens de Belém; a de se  refugiar num lugar ermo e ali ver nascer o Filho de Deus; a de ser um homem apagado, o “carpinteiro”, rejeitado por amor à justiça. A glória, exatamente, daquele que, enquanto comovedora prefigura, tomou sobre si as humilhações, a ignomínia, todo o peso do opróbrio que um dia recairiam sobre o divino Redentor.

São José

De todas as gloriosas palavras sobre São José, outras não dizem tanto quanto a simples afirmação de que foi esposo de Nossa Senhora e pai legal de Nosso Senhor Jesus Cristo. Pois Deus, tão magnificiente no predestinar, modelar e cumular de graças a Mãe do Verbo Encarnado, se-lo-ia menos no escolher e formar o homem destinado por Ele a ser esposo dessa Virgem Mãe e pai jurídico desse Filho?

São José, nobre e virgem

São José teve de modo supereminente a nobreza e também a pureza que é a virtude mais conveniente a um nobre.

Nosso Senhor Jesus Cristo, ao morrer, quis entregar sua Mãe Virgem a um apóstolo virgem. Não teria querido também que Ela estivesse sob a guarda de um esposo virgem? Para ser esposo da Virgem das virgens, alguém poderia não ser virgem? É uma coisa verdadeiramente inconcebível.

Em São José brilhava a dignidade, a categoria, a largueza de visão, a segurança de um homem que é patriarca, rei e príncipe. E, ao mesmo tempo, o fulgor da virgindade. Um varão segundo o Sagrado Coração de Jesus e o Imaculado Coração de Maria.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 8/10/1966)

São José, modelo de confiança em meio à perplexidade

“Eis como nasceu Jesus Cristo: Maria, sua mãe, estava desposada com José. Antes de coabitarem, aconteceu que ela concebeu por virtude do Espírito Santo. José, seu esposo, que era homem de bem, não querendo difamá-la, resolveu rejeitá-la secretamente. Enquanto assim pensava, eis que um anjo do Senhor lhe apareceu em sonhos e lhe disse: José, filho de David, não temas receber Maria por esposa, pois o que nela foi concebido vem do Espírito Santo. Ela dará à luz um filho, a quem porás o nome de Jesus, porque ele salvará o seu povo de seus pecados. (…) Despertando, José fez como o anjo do Senhor lhe havia mandado e recebeu em sua casa sua esposa” (Mt 1, 18-24).

Como nos mostra Dr. Plinio, nessa passagem do Evangelho transparece uma das eminentes virtudes de São José: sua inabalável confiança na superior vontade de Deus.

 

A grandiosa figura de São José sempre foi exaltada da maneira conveniente ao esposo de Maria Santíssima e pai adotivo de Jesus. Contudo, não será de todo supérfluo ressaltarmos uma faceta dessa luminosa alma, cujo brilho deve atrair de modo especial nossa admiração. Trata-se da heroica confiança por ele manifestada em decisivas ocasiões de sua vida ao lado de Maria e do Homem-Deus.

Voto de castidade e casamento

Como se sabe por fontes não inspiradas — as quais, entretanto, foram incorporadas pela Igreja na sua iconografia e na piedade popular — São José, por uma moção interna da graça, fizera voto de virgindade. Disposição esta que o afastava de uma existência matrimonial.

Ora, algum tempo depois, ele e outros varões da Casa de David são chamados a comparecer diante do Sacerdote a fim de participar da escolha de um esposo para Nossa Senhora. Reza a piedade católica que o eleito seria aquele cujo bastão florescesse miraculosamente. Para a surpresa de São José, em seu cajado brotaram lindos lírios brancos…

Assim, depois de a Providência incutir em sua alma os mais nobres desígnios de castidade perfeita, parece agora contrariá-los, realizando um milagre a fim de mostrar que ele deveria abraçar o casamento. Se nos colocarmos por um instante no lugar de São José, não será difícil compreendermos o dilacerante de tal perplexidade!

Deus estaria permitindo ao demônio ludibriar um desejo de castidade? Não era possível, pois tal anelo acendia na sua alma toda forma de bem. Deus queria seu casamento? Não podia admiti-lo, pois tal ideia, legítima e louvável para qualquer outro, nele determinava o fenecimento de tudo aquilo que o levava para o ideal, para a renúncia, enfim, para o perfeito amor a Deus.

Então, que caminho trilhar diante de duas vozes de Deus, diretamente contraditórias?

Dilaceração cruel. Entretanto, inteiramente submisso à vontade divina, confiando contra toda confiança, ele se dispõe a casar com Nossa Senhora.

Perplexidade das perplexidades

Os dois cônjuges, levados por mútuo desejo de perfeição, revelam um ao outro seu propósito de manter a virgindade perpétua. Imensa alegria, profunda compreensão das duas almas, e o mistério se resolve.

Por pouco tempo. Os meses passam e, num determinado dia, São José percebe que Nossa Senhora está esperando um filho. A dilaceração cruciante se lhe apresenta uma vez mais. Maria era tal que ele não podia duvidar de sua virtude. Mas, o fato era inegável, patente aos olhos de qualquer um. Como explicá-lo? Como não duvidar?

São José não duvidou. Foi embora. Preparou-se para abandonar o lar, pois não lhe ocorria outra solução.

Imagine quem possa a perplexidade na qual ele se abismava…

Mas, tratava-se de um varão tão confiante nos desígnios divinos que, no pináculo do seu drama, decidiu fazer as coisas de modo racional. Uma vez que partiria para uma longa viagem sem destino certo, devia estar bem repousado e munido de suficientes provisões de água e comida. Talvez terá preparado um meio de transporte animal, além de uma série de providências, em que cada coisa era um estrangulamento de sua alma. Mas, um estrangulamento tão pacífico, tão sereno, tão repleto de confiança que adormeceu sobre isso.

É interessante notar que o esposo castíssimo de Maria, embora se encontrasse na perplexidade das perplexidades, entretanto conseguia dormir. E quão mais belo o fato de ele ter dormido do que se permanecesse acordado, pois aquele terá sido dos sonos mais sublimes da História!

Em sonhos, a revelação do anjo

Com efeito, foi durante o repouso que ele recebeu em sonhos a revelação do anjo, anunciando-lhe que o Filho esperado pela Santíssima Virgem era o Verbo encarnado, concebido pelo Espírito Santo nas entranhas virginais de sua esposa.

Dir-se-ia que essa revelação encerrava um fator de certeza menor do que o oferecido a Nossa Senhora durante a Anunciação, uma vez que uma aparição feita em sonho pode não passar de simples sonho. Porém, devemos crer que tal manifestação do Céu tenha sido acompanhada de elementos de persuasão interna, os quais racionalmente não permitiam qualquer dúvida.

Assim, São José se tranquilizou, readquiriu a serenidade, não porque tivesse “tocado” no anjo (o qual, é claro, sendo puro espírito não pode ser apalpado), mas porque aquela explicação era talvez a única possível para o mistério diante do qual se achava. E esse homem de confiança heroica, deve ter feito o seguinte raciocínio: “Embora eu conheça as altíssimas virtudes de Maria, não tive a luz suficiente para imaginar que Ela fosse a Mãe de Deus. Porém, no sonho tudo se explicou, e agora vejo inteiramente confirmado tudo quanto me foi dado contemplar da personalidade d’Ela. Eis-me tranqüilo”.

Então, pode-se dizer ter sido São José mais bem servido pelo fato de o anjo lhe aparecer “em sonhos” e não quando estivesse acordado. Porque, ao raciocinar daquele modo, ele fez um ato de fé extremamente belo e de incomparável louvor a Nossa Senhora.

Encontro com a Santíssima Virgem após a aparição

É-nos dado conjeturar que São José não tenha acordado com a aparição do anjo, mas permaneceu em repouso até a manhã seguinte. Quando despertou, estava todo impregnado pela suavidade e esplendor da revelação recebida.

Como terá sido o primeiro encontro dele com Nossa Senhora depois desse fato?

Quiçá, tivera Ela conhecimento das palavras do anjo a São José e não se surpreendeu quando este se apresentou para Lhe manifestar seu preito de amor e veneração à futura Mãe de Deus.

Ambos se encontravam numa linda composição de situações. Admirando Nossa Senhora, São José pensava: “Eis minha esposa, tabernáculo de meu Deus”, e adorava o Verbo encarnado no seio puríssimo de Maria. Esta, por sua vez, durante a refeição, por exemplo, humildemente lhe perguntava se queria um pouco mais de ensopado…

A partir de então, o que se depreendeu é algo de tanta beleza que ultrapassa nossa pobre capacidade imaginativa.

Em meio às nossas incertezas, apelo a São José

Recordo, ainda, outra perplexidade à qual São José, em companhia de Nossa Senhora, viu-se exposto: a perda do Menino Jesus em Jerusalém.

São Lucas nos descreve o episódio, e da narração evangélica se conclui que Jesus não quis participar aos seus pais a decisão de permanecer na Cidade Santa. Resultado, Nossa Senhora e São José, aflitos, passaram três dias à procura do Menino, e finalmente o encontram no Templo, sentado no meio dos doutores, ouvindo-os e interrogando-os.

Considere-se o contraste dessa situação. Maria e José estavam no auge do abatimento quando entraram no Templo e acharam Jesus. Este, já com o uso da sua inteligência, discutindo com os sábios, causando assombro e admiração ao seu redor. Nossa Senhora e São José O viram e a angústia se transformou em alegria, em júbilo. Tanto mais que ambos estavam certos da inocência e da retidão do Homem-Deus, o qual teria tomado aquela atitude movido por altos desígnios.

Mas a perplexidade floresce na pergunta: “Filho, por que fizestes assim conosco?”

Uma indagação sem desconfiança, de quem deseja ser ensinado por Jesus. São José sofreu com aquela provação, assim como Nossa Senhora, porém manteve a confiança inabalável nas superiores disposições de Deus.

Creio não haver melhor modo de encerrar essas considerações senão recomendando que, em nossas dúvidas e perplexidades, quando nos sentirmos abalados na virtude da confiança, apelemos a São José, perfeito modelo de homem que soube confiar em meio às maiores provações.

Plinio Corrêa de Oliveira

São José, bem-aventurado entre os homens

Patriarca e Padroeiro da Igreja, São José era objeto de veneração e admiração profundas da parte de Dr. Plinio, quer por suas insignes virtudes, quer por ter sido escolhido para Esposo da Mãe de Deus e pai nutrício de Jesus. Admiração e veneração que Dr. Plinio procurava despertar também em seus discípulos, tecendo-lhes comentários como os transcritos a seguir, onde sobressaem os luminosos predicados da alma de São José.

 

Ao celebrarmos as excelsas virtudes de São José, talvez conviesse salientarmos, primeiramente, um aspecto da vida do glorioso patriarca pouco ressaltado nos comentários que sobre ele temos lido.

A glória de ter sido recusado

Refiro-me ao fato de ele, ao procurar um abrigo para Nossa Senhora prestes a dar à luz o seu divino Filho, ver que lhes recusavam lugar nas hospedarias de Belém. São José, Príncipe da Casa de David, nobre da família real ao mesmo tempo deposta e no seu apogeu, pois dela ia nascer o esperado das nações, bate às portas e é rechaçado.

Despedem a quem representava algo que a mediocridade de alguns homens sempre rejeitou, ou seja, a distinção, a majestade, enfim porque simbolizava a grandeza e a sublimidade do próprio Verbo Encarnado que Maria Santíssima trazia consigo.

Foi esta a primeira glória de São José, sua especial bem-aventurança de ter sido recusado no momento mais augusto da História. Nesse sentido, prenunciava em sua pessoa a renúncia tão mais acerba que Nosso Senhor Jesus Cristo sofreria mais tarde, culminando na crucifixão e morte no Calvário.

Sucessivas glórias e bem-aventuranças

Logo depois, teve São José a glória de conduzir Nossa Senhora aos arredores de Belém, e de com Ela se refugiar num lugar ermo, numa gruta que servia de habitação aos animais. Ali A acomodou e ali esteve, por amor à virtude, sozinho e abandonado dos outros homens. Ali também foi-lhe dada a suprema dita de presenciar o nascimento do Salvador.

A partir de então podemos dizer que as glórias se acumulam sobre São José, mas — oh! paradoxo! — quase todas negativas. Por exemplo, a de ser um homem apagado, do qual não se fala, ou a ele se referem com menosprezo. “Este (diziam os que motejavam de Nosso Senhor) não é filho daquele carpinteiro? Um filho de mero carpinteiro não pode ser Deus”. O que significa tomar São José como um fator de descrédito para o próprio Messias.

Os evangelistas são lacônicos ao mencionarem a figura do pai do Menino Jesus. Sobre ele pouco se sabe. Transparece nesse quase anonimato a glória daquele que padeceu, previamente, as humilhações e todo o peso da renúncia que devia cair sobre Nosso Senhor.

Bem-aventurado São José, que sofreu por amor à justiça, assim como bem-aventurado porque nele se cumpriam todas as bem-aventuranças que o Divino Mestre enumerou no sermão da montanha. Varão bem-aventurado entre os homens, abaixo do próprio Jesus e de Maria Santíssima, limpo de coração como nenhum outro, porque esposo virginal da Virgem por excelência.

Único homem à altura de Maria

Esposo de Nossa Senhora! Todos os louvores e exaltações, todas as enaltecedoras palavras sobre São José não podem dizer tanto quanto a simples afirmação de que ele foi o esposo de Maria e o pai adotivo do Menino Jesus.

Compreende-se que a Divina Providência, ao eleger a mãe do Verbo Encarnado, adornou-a de qualidades e atributos insondáveis inerentes a tão excelsa prerrogativa. Donde excederem a toda capacidade de intelecção humana o conceber os limites desses atributos e qualidades existentes na pessoa de Maria Santíssima. Ela é, inconteste, a mais perfeita dentre as simples criaturas. Se tomarmos a soma das excelências de todos os anjos e de todos os homens que já existiram, existem e existirão na face da Terra, não teríamos sequer pálida ideia da perfeição da Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Ora, então pergunta-se: se Deus foi tão magnificente no predestinar e modelar a mulher que daria ao mundo o Salvador, e em cumulá-la das mais preciosas graças, seria Ele menos pródigo no escolher o homem que deveria ser o esposo dessa Virgem e dessa Mãe?

Evidentemente não. Um homem tinha de ser considerado proporcionado a essa esposa: por seu amor a Deus, pela sua justiça, pureza, sabedoria e todas as demais qualidades. Esse homem, escolhido por tal adequação à pessoa de Nossa Senhora, foi São José.

Proporcionado ao Filho

Em segundo lugar, o pai deve ser proporcionado ao filho. E só nesse aspecto a grandeza de São José se nos apresenta indizível. Cumpria que o homem escolhido para tal missão a desempenhasse com incomparável dignidade, e assumisse a posição de verdadeiro pai do Redentor, mostrando-se à altura d’Ele. São José foi este homem. Estava na proporção de Jesus Cristo, assim como estava na proporção de Nossa Senhora.

Para formarmos alguma ideia do que representa essa maravilhosa condição de pai e protetor do Verbo Encarnado, pensemos, por exemplo, nas imagens de Santo Antônio que se veneram em certos altares: o santo traz em seu braço o Menino Jesus, e para este dirige um olhar embevecido, repassado de uma felicidade imensa porque, em razão de um milagre, teve o Filho de Deus em seus braços durante alguns instantes. E nós, do nosso lado, fitamos a imagem igualmente embevecidos, exclamando em nosso interior: “Feliz Santo Antônio, ao qual foi dada essa honra inefável de carregar o Menino-Deus”.

Ora, quantas vezes São José terá conduzido o Divino Infante em seus braços? Dias, meses, anos ele O viu crescer, rezar, praticar todos os atos de sua vida comum.Ouvi-O, e teve, ele mesmo, os lábios suficientemente puros e a humildade suficientemente grande para fazer essa coisa formidável: responder a Deus, dar ao Menino os conselhos que Este lhe pedia, sabendo que era a criatura aconselhando o Criador…

Vemos, então, essa glória única de São José, a de ser o homem capaz de governar a Sagrada Família, de cuidar das necessidades terrenas de Nossa Senhora e de Jesus Cristo, inteiramente adequado e proporcionado à altura dessa dignidade.

Modelo de devoção mariana

Devemos acrescentar a tais excelências essa outra: São José é o modelo do devoto mariano. Com efeito, ninguém representa melhor a devoção a Nossa Senhora do que o homem escolhido para ser seu esposo, aquele que — podemos imaginar — A contemplava continuamente, admirando-A nos seus gestos e nas suas palavras, haurindo dessa contemplação ricas lições de sabedoria, recebendo a propósito dela graças extraordinárias, e a todo momento conformando sua alma à d’Ela.

Por isso mesmo, além de perfeito devoto de Nossa Senhora, São José é também o modelo do espírito contemplativo, do espírito afeito ao cultivo da vida interior, para o qual elevar-se às altas cogitações e considerar todas as coisas em função de Deus constitui a genuína felicidade de sua existência. Glorioso São José, modelo de sabedoria, de força, de pureza.

A verdadeira face de São José

Concluo esses comentários com uma ponderação colateral, porém a meu ver oportuna.

Não raro nos deparamos com gravuras e imagens que representam São José com um perfil moral muito aquém de todas essas excelsas qualidades e virtudes que acima salientamos. Donde me parecer não devermos aceitá-las como legítimas manifestações da verdadeira personalidade do pai de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Creio que, para se ter alguma ideia do semblante espiritual de São José, seria preciso deduzir, à maneira de suposição, o caráter de um homem que esteve à altura de ser o pai d’Aquele cuja Sagrada Face está estampada no Santo Sudário de Turim. Quer dizer, o homem que foi o educador, o guia, o protetor do senhor daquele rosto impresso no sudário; um homem que foi da mesma linhagem, parente e esposo da Mãe d’Ele.

Conceber algo menor que isso é não ter ideia da extraordinária figura de São José, modelo de fisionomia sapiencial porque consorte da Sede da Sabedoria, do Espelho da Justiça, Maria Santíssima. Modelo de fortaleza, porque pai do Leão de Judá, Nosso Senhor Jesus Cristo.

A este verdadeiro São José devemos elevar nossas preces, rogando-lhe interceda por nós junto à Virgem Santíssima e a seu Divino Filho, e nos alcance a graça de o imitarmos nas suas magníficas virtudes.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferências em 19/3/1966 e 18/3/1967)